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Censura ao topless na França: zelo ou controle do corpo feminino?

Miga, pense na seguinte cena: você está na praia, pegando aquele bronze do verão, aproveitando aquele sol que só o Brasil tem e chegam dois policiais dizendo: “Pode se cobrir. Aqui nessa praia não é permitido usar fio-dental.” Qual seria sua reação a essa chamada? Certamente não seria diferente da que teve uma banhista ao ouvir dos guardas franceses que ela teria que cobrir os seios, sendo que o topless é totalmente permitido na França.

Segue aqui comigo, então, pra você entender melhor essa história.

O incidente

Poderíamos imaginar que as únicas histórias de praias, neste verão de desconfinamento na França, seriam problemas de distanciamento social, ou inovações para cumprir normas de saúde para combater a disseminação do coronavírus. Mas, pelo jeito, o excesso de zelo da polícia de Sainte-Marie-la-Mer (Pirineus Orientais), gerou mais buzz entre os banhistas nesse verão do que o próprio Covid-19. Tudo começou quando dois policiais pediram a três mulheres praticando topless que se vestissem.

“Fiquei tão chocada com o que estava acontecendo, foi a minha alma feminista que falou. Eu perguntei se para eles se bronzear com seios nus era uma indecência. Eles me pediram para eu sair da praia “.

“Esses seios nus na praia. Que indecência” | Reprodução: DDM – PEZ | ladepeche.fr

A história foi confirmada pela prefeitura de Sainte-Marie-la-Mer e depois pela própria corporação policial, que foi obrigada a fornecer detalhes sobre o incidente, dada a extensão da polêmica na internet. A postagem foi compartilhada mais de 560 vezes e solicitada por mais de 1.900 pessoas.

O que diz a lei francesa

Na lei francesa, nada proíbe aproveitar o sol ou nadar com os seios nus na praia. Como especifica este advogado, o “topless” na praia já não é passível de constituir o crime de exibição sexual do artigo 222-32 do Código Penal. Isso em particular devido à evolução dos costumes. Assim, como esse comportamento já é de praxe dos veranistas de Sainte-Marie-la-Mer, toda mulher tem todo o direito de tomar sol de topless. As mulheres chamadas à ordem estavam, portanto, dentro de seus direitos.

Por sua vez, a prefeitura de Sainte-Marie-la-Mer reiterou que nenhum decreto municipal proíbe a prática do monokini na praia. “A prefeitura e seu prefeito acreditam que o fato de uma mulher se bronzear com os seios à mostra não constitui de forma alguma um atentado ao pudor ou aos bons costumes. Na verdade, nunca pedimos à polícia para agir neste contexto”, acrescenta.

Como um lembrete, a prática de topless na França não constitui mais um crime de exibição sexual. O bronzeamento feminino em topless ainda pode ser multado quando a praia é regulamentada por uma lei municipal que proíbe certos trajes, como tangas.

O caso Sainte-Marie-la-Mer subiu ao mais alto nível do Estado, uma vez que o Ministro do Interior, Gérald Darmanin, dividiu uma mensagem postada em sua conta do Twitter, como faz agora cada vez com mais frequência.

“Sem fundamento, duas mulheres foram reprimidas por seus trajes na praia. A liberdade é um bem precioso. E é normal que o governo admita seus erros”.

Você toparia fazer topless?

Miga, confesso que eu ainda não tive coragem de deixar meios seios à mostra nas praias daqui, mas já adianto pra você que isso é tão normal quanto andar de fio-dental no calçadão de Copacabana. Tão normal, que algumas brasileiras já fizeram topless por aqui e relataram sentir a mesma liberdade que estamos sentindo agora ao aposentar nossos soutiens quando saímos (a essa moda eu já aderi, miga, e recomendo!). Por isso, trouxe aqui um depoimento de uma brasileira que se deparou com a cena do topless pela primeira vez na Europa.

Como tudo começou

(…) Nesse momento, então, reparo uma espécie de reunião de senhoras. Elas traziam suas espreguiçadeiras e as concentravam próximas para conversar. Deviam ter entre 60 a 70 anos. Era um grupo animado e se postaram diretamente na beira do mar. Achei inspirador aquele cenário de amigas idosas se encontrando na orla e, mais curioso ainda, estavam todas – sem exceção – de biquíni, porém, sem a parte de cima dele. As vovós estavam só de calção e super a vontade! Horrorizada – vejam bem, eu estava ainda cheia de preconceitos, pois mal tinha completado 1 ano morando na Áustria -, viro-me para o meu marido e pergunto:

“O que essas vovós estão fazendo seminuas na praia?”

Meu marido: “Tomando sol e se divertindo”.

Eu: “Mas elas não têm vergonha?”

Meu marido: “Por que deveriam ter?”

Eu: “Porque, primeiro: estão de biquíni – desde quando uma vovó usa biquíni?, dizia o diabinho trazido da Terra Brasilis, no meu ombro -, segundo: isso é uma praia familiar.

Meu marido: “O que o topless das vovós tem a ver com ambiente familiar? Isso é apenas nudez. Não é pornografia. Elas estão ali, tranquilas, se divertindo e tomando sol. Qual é o problema, afinal?”

Resolvi deixar pra você, miga, essa parte do diálogo que pra mim é essencial: é preciso ver esse comportamento sem a mentalidade sexual e pornográfica que nos foi imposta desde sempre no Brasil. Na Europa, a nudez dos seios é absolutamente normal e, se alguém está deturpando essa imagem, o erro está nos olhos de quem vê, e não na mulher que só está ali se bronzeando com o peito à mostra, tal qual sua mãe fazia, e antes dela sua avó.

Topless no Brasil: será?

Trouxe também um vídeo relativamente antigo, mas ainda polêmico: será que um dia veremos essa moda pegar no Brasil?

Apesar de achar que ainda temos um longo caminho pela frente na ceitação do topless no Brasil, eu sinceramente, adoraria ver essa mudança de mentalidade arcaica do brasileiro em relação a essa prática.

O que essa história nos ensina?

Miga, agora volto pra você a pergunta do início desse texto: qual seria sua reação diante da repreensão sobre um comportamento já aceito dentro da sua sociedade? Por isso, me coloco no lugar da mulher que sofreu esse assédio na França, caso um policial me mandasse colocar um biquíni maior na praia, ou uma saia mais comprida no shopping. Seja na França ou no Brasil, temos a impressão de que parte da população ficou presa no século passado! E devemos frisar que esta história não deve ser tomada como um caso isolado, mas como uma ilustração entre tantos outros do controle patriarcal do corpo feminino pela sociedade. Esse é o X da questão nessa reflexão toda!

E você, o que acha dessa postura policial?

Bisous Bisous et à la prochaine!

Carioca da gema, me formei em Publicidade pela PUC-Rio em 2009 e, aos 30 anos, resolvi mudar de área e seguir minha paixão: Letras! Comecei a nova faculdade em 2016 e hoje moro na França para realizar meu mestrado na Paris Sorbonne. Amante incondicional de bichinhos, de Sol e de viagens para qualquer lugar do planeta, estou sempre em transição (inclusive a capilar! rs)

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